Logo após terminar as eleições municipais de 2024, já se iniciou uma movimentação de políticos e partidos para antecipação das eleições estaduais e presidencial de 2026. Indiferentes à vontade e às demandas dos eleitores muitos políticos – principalmente com mandato, ou parentela e até mesmo asseclas – estão buscando se viabilizar para manter ou alcançar mandato eletivo.
Nessa roda-viva, muitos gestores e parlamentares municipais se articulam, buscando “negociar” ou barganhar seus apoios a candidatáveis no próximo pleito eleitoral, por meio de um astuto jogo político, moralmente questionável, mas eticamente justificável – a ética política.
Dentro do pensamento político de Maquiavel há uma ética imbrincada, isto é, uma “ética laica” segundo a qual as ações individuais (dos políticos) não são julgadas pelo seu coeficiente intrínseco de moralidade, mas pelo efeito político que podem produzir frente a determinada situação de fato, onde os fins justificam os meios para alcançar o que se quer.
Maquiavel mostrou existirem duas éticas distintas: uma “ética cristã”, útil para salvar a alma (ser bom sempre, nunca mentir, não usar máscaras), e uma “ética política”, útil para salvar o Estado (ser mau quando necessário, mentir quando a situação exigir, parecer bom e piedoso). Para poucos, é a racionalidade na política, porém, a muitos outros a política é vista como a arte da trapaça.
Nesse contexto, pode-se cogitar a existência de uma possível relação de barganha, para além da política, entre os candidatáveis e os representantes municipais que se envolverão nas eleições vindouras. Aparentemente, o interesse popular, o bem comum e a ideologia política são alguns aspectos irrelevantes ou em segundo plano, pois esses não agregam nem favorecem o plano de voto-e-favor ou do toma lá dá cá.
Ademais, mesmo com a gama de informações disponíveis nas redes sociais – excetuando os fake news – a maioria do eleitorado tende a ignorar ou apagar da memória os personagens, os arranjos e os desarranjos das eleições municipais de 2024. Isto inviabiliza a reflexão crítica daqueles sobre a história dos candidatáveis e de suas reais intenções no jogo político pelo poder.
Nesse sentido, a antecipação das eleições é uma das táticas intencionais dos políticos carreiristas para impedir a autocrítica por parte do eleitorado sobre a realidade vivida, os incômodos e as suas demandas prioritárias. E, assim, fazer da política, ou através de cargos eletivos, um meio de vida para si em detrimento do bem comum.
Destarte, antecipar as eleições não é o mesmo que antever as soluções para as causas dos problemas sociais ou uma bem querência irrecusável pelo bem público. Sem generalizar, não é com a antecipação das eleições que os políticos se aperfeiçoam, mas se perpetuam ou chegam no poder político, impedindo a renovação dos representantes e o redirecionamento da prática política no país – por exemplo, muitos candidatáveis trazem consigo um histórico negativo de ações públicas, que antevê o que virá no exercício do mandato eletivo.
Todavia, no jogo de tudo pelo poder político, é o eleitorado – o dono do poder – que tem o papel fundamental para nivelar por cima o resultado nas urnas e, como isso, experienciar uma nova relação entre os representantes políticos, os cidadãos e as demandas sociais que dependem de ação política.
Portanto, a antecipação de um pleito eleitoral não é um problema em si, se o eleitorado cultivar uma consciência política que o demova da condição de expectador. Um eleitor ou eleitora que assiste e/ou insiste no velho nada mudará na vida, na gestão política e no cotidiano.