Quase um mês após o colapso do lixão Ouro Verde, em Padre Bernardo (GO), região do Entorno do Distrito Federal, o Brasil se depara com uma crise ambiental de proporções ainda indefinidas, mas já considerada por especialistas como uma das mais graves dos últimos tempos.
Em entrevista ao Metrópoles, Fábio Miranda, chefe da Área de Proteção Ambiental (APA) da Bacia do Rio Descoberto, vinculada ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), fez uma afirmação impactante, os danos ambientais podem ser comparáveis aos da tragédia do Césio-137, em Goiânia, ocorrida em 1987.
Uma montanha de lixo que virou um desastre ecológico
O colapso da estrutura do Aterro Ouro Verde ocorreu em 18 de junho de 2025. Uma verdadeira avalanche de lixo, estimada em cerca de 40 mil toneladas, se espalhou por áreas próximas, atingindo corpos hídricos e ameaçando a segurança de moradores e ecossistemas.
O lixão está localizado dentro da Área de Preservação Ambiental (APA) da Bacia do Rio Descoberto, fundamental para o abastecimento hídrico da região. O local não possuía licenciamento ambiental adequado, apesar de operar com base em uma liminar judicial expedida há dois anos.
O aterro recebeu de forma irregular resíduos perigosos, como lixo hospitalar, inclusive seringas usadas, segundo relatos de técnicos que visitaram o local.
Contaminação invisível
A tragédia gerou uma contaminação profunda do solo e da água, com potencial de impacto duradouro. Fábio Miranda destacou que o solo já apresenta presença de mercúrio e outros poluentes ainda não identificados.
A gravidade é tamanha que as autoridades temem uma contaminação do lençol freático, que abastece poços e nascentes da região. As águas do Rio do Sal e do Córrego Santa Bárbara foram contaminadas e tiveram o uso proibido por tempo indeterminado.
Quatro bacias de chorume presentes no lixão estão em risco de colapso, o que pode levar a novos desabamentos e à ampliação da tragédia. O risco biológico é elevado, com exposição a agentes infecciosos e metais pesados.
Comparação com o Césio-137
A referência ao desastre radioativo de 1987, que contaminou pessoas e imóveis em Goiânia, não é feita levianamente. Apesar de diferentes na natureza, um envolvendo radiação e outro, poluição química e biológica, ambos os casos compartilham a persistência da contaminação ao longo de décadas e a dificuldade de remediação ambiental.
O Césio-137 ainda deixa marcas no solo goianiense, 34 anos após o ocorrido. Especialistas alertam que a situação de Ouro Verde pode ter impacto equivalente ou .maior no ecossistema, pela extensão da área afetada e a diversidade de poluentes envolvidos.
Responsabilização e respostas institucionais
A empresa responsável pela administração do aterro foi multada em R$ 37,5 milhões pelo Governo de Goiás. Também houve bloqueio de R$ 10 milhões das contas da empresa, para garantir recursos destinados às ações emergenciais de contenção e recuperação ambiental.
Um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) está sendo negociado com a Secretaria do Meio Ambiente de Goiás (Semad).A empresa declarou que vai iniciar ações para reduzir os danos e impedir a continuidade da contaminação. O Ministério Público Estadual e o Ministério Público Federal já movem ações civis públicas por dano ambiental.
Agora, mais do que nunca, será preciso transparência, ciência, responsabilidade e rigor técnico para lidar com as consequências.